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quarta-feira, 27 de julho de 2005

Orientações europeias

Ministro não vê necessidade de rever a Constituição para combate ao terrorismo
Eduardo Dâmaso e Paula Torres de Carvalho, Público de hoje

Apesar do atraso na transposição, Alberto Costa considera que a posição de Portugal
"é bastante boa"


"Não vejo nenhuma necessidade de rever a Constituição para consagrar novos instrumentos" de combate ao terrorismo, disse ao PÚBLICO o ministro da Justiça, Alberto Costa.
Na sua opinião, Portugal evoluirá nesse domínio segundo o "parâmetro constitucional" existente e não se justifica a introdução de instrumentos legais semelhantes aos já adoptados por vários outros países da Europa.
Apesar do atraso registado na transposição de determinadas decisões europeias relativas ao combate ao terrorismo para o direito nacional português, Alberto Costa considera que, "no conjunto", a posição de Portugal "é bastante boa" e "confortável" e que, relativamente à transposição de instrumentos, "seguramente não temos muito problema."
Algumas das medidas de combate ao terrorismo aprovadas no início de 2000 pelo Conselho de Ministros da Justiça dos Assuntos Internos europeus para entrar em vigor em Junho do ano passado, registam atraso na sua transposição para Portugal.
É o caso da decisão quadro sobre o branqueamento de capitais, o protocolo à convenção de assistência mútua em matéria criminal, o protocolo de reforço da acção da Europol e a decisão quadro sobre execução de ordens de congelamento de propriedade e provas.
Alberto Costa defende que o Governo deve "acompanhar a agenda europeia" e participar "activamente na discussão, transportando para dentro dela a nossa própria visão e valores jurídicos" e fazer então a "transposição apropriada."
Em declarações ao PÚBLICO sobre a proliferação de responsabilidades reivindicadas em Portugal no que respeita ao combate ao terrorismo, o ministro da Justiça reafirmou a ideia de que a competência para investigar os crimes relacionados com o terrorismo é da Polícia Judiciária e que "não se pode retirar ou desvalorizar uma componente que tem esta prerrogativa e cujos instrumentos legais são conhecidos".
Relembrando que, na Europa, a palavra de ordem é a cooperação e a coordenação das estruturas existentes, Alberto Costa salienta a importância da partilha de informações entre os vários orgãos de polícia criminal.

Base genética gradual

Quanto à anunciada criação de uma base de dados genética a nível nacional para fins de investigação criminal (vista também como um contributo para melhora a eficácia do combate à criminalidade organizada), o ministro da Justiça diz que a ideia se mantém mas para ser desenvolvida de forma "gradual".
Esta medida incluída no programa do Governo e que foi alvo de forte polémica, foi apresentada como uma forma de "facilitar a identificação de criminosos a partir de amostras recolhidas no local de um crime e compará-las depois com a base de dados nacional". A utilidade de uma base de dados com estas características seria também extensível, por exemplo, à "identificação de vítimas em situações problemáticas." Tutelado por uma entidade dotada de independência e não por qualquer órgão de polícia criminal, seria assegurada a confidencialidade de todos os dados e evitada a sua utilização indevida, previa a proposta do Governo.
Esta ideia foi, no entanto, encarada com fortes reservas, tanto por ser inédita nos países da União Europeia, como por implicar avultado investimento financeira.
Contudo, não foi posta de parte, segundo Alberto Costa. "Houve inicialmente um certo interesse por esse tema que não correspondeu ao nosso próprio calendário", explica.
A ideia de alargar essa base de dados à totalidade da população, "mantém-se", confirma, notando, porém, que isso deve ser feito "gradualmente" até porque "os parâmetros financeiros são restritos".
Embora concedendo prioridade à utilização desses dados para fins de investigação criminal, o ministro adianta que não pode ser excluída a utilidade desses dados "para certas dificuldades de natureza cível". Mas será um processo a "evoluir com ponderação", nota, assegurando que a visão do Governo sobre esta matéria é garantística e não orweliana e que será realizado um debate público sobre o assunto.


Processos dos corredores para os computadores

Para acabar definitivamente com a imagem dos tribunais cheios de processos acumulados nos corredores e nos gabinetes, o Ministério da Justiça apresentou um projecto de "desmaterialização" dos processos judiciais no qual tenciona investir 13 milhões de euros.
Esta medida traduz-se na informatização dos processos que tramitam entre vários tribunais e na simplificação nos actos dos serviços de registo e notariado.
A prioridade vai ser atribuída à digitalização dos recursos interpostos para os tribunais superiores. Com a aplicação desta medida, os juízes desembargadores passam a poder trabalhar em casa num computador, em vez de terem de transportar com eles os grossos volumes dos processos. Este projecto foi incluído no plano da infra-estruturas prioritárias, sendo a primeira vez que tal acontece no sector da Justiça.
"Esta desmaterialização representa a concepção do sistema judicial como uma grande infra-estrutura cívica", considera Alberto Costa, em declarações ao PÚBLICO.
Outra das mais recentes iniciativas do Ministério da Justiça, já em prática, é a que possibilita a constituição imediata de empresas, as "empresas na hora", que entrou em vigor no passado dia 14. Desde aí, foram já constituídas 57 sociedades, incluindo uma anónima, 17 unipessoais e as outras por quotas, o que "representa um indicador de receptividade muito estimulante", no entender de Alberto Costa.
De acordo com uma lógica comum ao tratamento da acção executiva e do descongestionamento dos tribunais, passa a ser possível que, na mesma ocasião, o interessado escolha o nome, o pacto social e preencha os elementos necessários para o concluir. O conservador procede ao registo e emite, na hora, o cartão de pessoa colectiva.
A avaliação da aplicação desta medida vai ser feita no último trimestre deste ano, altura em que se tomarão decisões sobre a sua expansão. "Por enquanto, a experiência está a justificar interesse e investimento nesta matéria e esforço para acelerar a sua expansão", diz o ministro.
E.D./P.T.C.

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