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sexta-feira, 22 de julho de 2005

Mais um caso de esgotamento do prazo máximo da prisão preventiva

Supremo anulou o seu julgamento
Acusado de duplo homicídio solto hoje por se ter esgotado prazo da prisão preventiva
22.07.2005 - 09h17 Paula Torres de Carvalho
Por esgotamento do prazo máximo de prisão preventiva, vai ser hoje libertado da cadeia de Angra do Heroísmo, nos Açores, um homem condenado, em primeira instância, a uma pena de 25 anos de prisão por homicídio qualificado.

O tribunal da Praia da Vitória, na lha Terceira, que julgou e condenou Roberto Carlos Bernardo Branco a duas penas de 16 e 19 anos de cadeia - o que totalizou, em cúmulo jurídico, a pena única de 25 anos - por autoria material de um duplo homicídio, foi agora obrigado a emitir um mandado de soltura deste recluso, a cumprir hoje, dia em que se esgota o prazo máximo de prisão preventiva fixado em 30 meses.

Após a sua condenação em primeira instância, Roberto Branco foi enviado para o Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus (prisão para condenados) em Alcoentre.

Não se conformando com esta decisão, o arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa que aí deu entrada em Maio de 2004.

De acordo com os procedimentos normais, o processo foi, primeiro, ao Ministério Público que não emitiu parecer, seguindo para o juiz relator, Almeida Cabral. Este elaborou um projecto de acórdão que, ainda em Maio, foi apresentado ao presidente da secção criminal para marcar julgamento.

Notificadas as partes, a audiência realizou-se a 14 de Outubro do ano passado. Em acórdão, o Tribunal da Relação confirmou a sentença da primeira instância que condenou Roberto Branco a 25 anos de prisão.

Contudo, o processo não ficaria ainda encerrado com a decisão daquele tribunal superior. Insatisfeito, o recluso de Vale dos Judeus voltou a interpor recurso, desta vez para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), onde deu entrada em Fevereiro deste ano.

Depois de apreciarem o caso, os juízes conselheiros declararam nulo o acórdão da Relação por considerarem não estar devidamente fundamentada a sentença do tribunal da Praia da Vitória.

Segundo os juízes do STJ, a Relação deveria ter reconhecido que o acórdão produzido em primeira instância, "ao fixar a pena conjunta, não procedeu a uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito que possam ter fundamentado a decisão".

A Relação teve de acatar o acórdão do Supremo, do qual tomou conhecimento, em Abril, e deu provimento ao recurso. O processo de oito volumes foi remetido, a 9 de Junho passado, a título definitivo, ao tribunal da Praia da Vitória para proferir uma nova decisão.

O prazo de prisão preventiva (por via de recurso) em que se encontrava Roberto Branco esgota-se entretanto hoje. O mandado de soltura vai ser cumprido e tudo voltará ao início. O julgamento vai ser repetido e Roberto Branco vai aguardá-lo em liberdade. Ficará, contudo, obrigado a apresentar-se regularmente às autoridades policiais.

Este é mais um caso que volta a por em causa o sistema de recursos existente em Portugal.

Esta questão foi alvo de forte polémica, no passado mês de Abril, a propósito do processo que ficou conhecido como o do "gang do Vale de Sousa". Três suspeitos da morte de um inspector chefe da PJ, foram libertado também devido ao esgotamento do prazo de prisão preventiva.

O inspector foi atingido mortalmente a tiro, em Janeiro de 2001, em Marco de Canavezes, durante a perseguição dos assaltantes de uma carrinha de valores. A libertação dos suspeitos, já condenados por outro crime, determinou a abertura de processos de averiguações por parte do Conselho Superior de Magistratura e da Procuradoria-Geral da República.

O número de situações em que arguidos condenados em primeira instância são soltos em consequência do esgotamento do prazo de prisão preventiva, está a aumentar em Portugal, segundo fonte da Direcção Geral dos Serviços Prisionais que referiu não existirem dados estatísticos sobre este tipo de situações.

Em declarações ao PÚBLICO, o juiz-conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, Pinto Monteiro, defendeu que o Tribunal da Relação deve ser a última instância em matéria de recursos e que o STJ deveria apenas funcionar como um tribunal de "revista" reservado à discussão de "causas de interesse nacional." No seu entender, o legislador "tem de encontrar uma medida que impeça" os prejuízos causados pelo actual sistema de recursos.

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