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quinta-feira, 28 de julho de 2005

Mais uma entrevista do Ministro da Justiça...

... desta feita ao Correio da Manhã

Lei prevê substituição dos juízes

Alberto Costa, ministro da Justiça, leva hoje à Assembleia da República o seu projecto de redução das férias judiciais de 83 para 53 dias. O encurtamento do período de Verão tem gerado controvérsia, mas o ministro garante que a ideia não é nova e que Governos anteriores já a testaram sem sucesso.

Alberto Costa vai hoje dizer à Assembleia da República que o PSD não teve coragem para levar por diante esta reforma


Correio da Manhã – Espera solidariedade da oposição em relação ao projecto de redução da férias judiciais?

Alberto Costa – Ainda não sei qual vai ser o sentido de voto dos partidos da oposição. O certo é que o professor Cavaco Silva e o seu Governo, em 1987, propuseram ao Parlamento a redução das férias judiciais de Verão e portanto ou há coerência com esta antiga posição ou há uma evolução negativa da modernização do País que não quero acreditar.

– Não me parece que a votação o vá surpreender. Há dias o deputado Paulo Rangel (PSD) classificou este projecto como uma “reforma pepsodent”.

– Tenho muita dificuldade em interpretar essa declaração. Estamos a lidar com um conjunto muito grande de medidas, de alterações e mudanças que estão longe de se esgotar neste projecto, nomeadamente as medidas para o descongestionamento dos tribunais e para desbloquear a acção executiva. As medidas já tomadas são susceptíveis de incidir sobre um sexto dos processos que integram o universo da Justiça Penal.

– Apesar do protesto generalizado, avança contra tudo e contra todos. Porquê?

– Todas as vezes que se tentou fazer a redução das férias judiciais de Verão houve contestação generalizada, das várias instituições, conselhos, órgãos e associações etc. Desta vez, pretendemos fazer aprovar a iniciativa, independentemente das posições que são adoptadas e que não têm nenhuma originalidade. Se consultarmos os documentos emanados pelas mesmas entidades, por exemplo, há 18 anos, são praticamente os mesmos.

– Que comentários lhe merecem as palavras do presidente do Supremo quando diz que o Governo está a comprar uma guerra com a Magistratura?

– Nada nos move contra os magistrados judiciais e do Ministério Público. Já manifestei o meu apreço pelo seu trabalho e dedicação. Esta não é uma reforma contra ninguém, é uma reforma a favor de um melhor funcionamento do sistema judicial.

– Confronto-o também com Souto Moura, segundo o qual a reforma não é exequível. O anterior Procurador-Geral da República tinha a mesma opinião?

– O procurador da época tinha um estilo muito pessoal. Não sei se é possível fazer a comparação dos pronunciamentos assumidos. A reforma é viável, exige cooperação, capacidade de gestão e exigirá também aplicações informáticas. Algumas das críticas que são feitas assentam num grande desconhecimento.

– Souto Moura tem condição para continuar?

– É uma matéria sobre a qual não é adequado proferir juízos ou tecer cenários. Tem de haver coesão institucional.

– Os magistrados gozam as suas férias preferencialmente no Verão.

– Temos um horizonte de 53 dias. Não está no diploma que seja nas férias judiciais de Verão.

– Não vamos correr o risco de termos os tribunais a trabalhar, mas sem gente lá dentro?

– A lei prevê mecanismos de substituição para os casos em que não há juiz – por uma razão ou por outra, justificada – que incluem ou outros juízes ou pessoas idóneas licenciadas em Direito, designadas pelo Conselho Superior da Magistratura. O sistema está equipado para dar resposta a essas situações que serão detectadas com antecedência

– Já que falamos de férias, o ministro da Justiça tem direito a quantos dias?

– Estou a pensar tirar uns dias no mês de Agosto.

– Uma semana?

– Menos do que isso não terá o efeito pretendido.

GREVE DE MAGISTRADOS INCONSTITUCIONAL

– Teme uma greve de magistrados?

– Não temo porque os magistrados judiciais são titulares de órgão de Soberania. Não quero imaginar, não posso imaginar, que haja uma situação dessas por parte de titulares de órgãos de Soberania, tal como teria dificuldades em conceber que deputados ou membros do Governo se organizassem para recorrer à greve. Julgo que nesse domínio prevalecerá uma consciência constitucional.

– Uma greve seria inconstitucional?

– O direito à greve não se encontra previsto na Constituição como um instrumento ao serviço dos órgãos de Soberania. Temos de extrair conclusões das normas constitucionais e não fingir que elas não existem. Estou totalmente convencido de que uma compreensão adequada do quadro constitucional legal prevalecerá.

– O que é que a Justiça necessita efectivamente?

– Aumentar o número de juízes ou de magistrados do Ministério Público ou mesmo de funcionários judiciais significaria afastar-nos negativamente da média europeia. Precisamos de algumas reformas, melhor organização, melhor aproveitamento dos recursos e, fundamentalmente, de modernização de processos.

PERFIL

Alberto Bernardes Costa nasceu em Évora de Alcobaça, Leiria, em 1947. Licenciou-se em Direito na Faculdade de Direito de Lisboa. Foi candidato a deputado pela Oposição Democrática pelo círculo de Leiria (1969), tendo a sua candidatura sido impedida pela PIDE. Em resultado da sua prisão pela polícia política e exclusão de todas as Universidades por decisão do Governo da ditadura, a França concedeu-lhe o estatuto de refugiado político (1973-1974). Foi presidente da Comissão Parlamentar dos Assuntos Europeus, membro da Assembleia Parlamentar do Atlântico Norte, ministro da Administração Interna (1995/97), tendo integrado o Conselho de Ministros de Justiça e Assuntos Internos da União Europeia. Foi membro da Convenção Europeia que preparou a Constituição para a Europa em representação do Parlamento português (2002-2003).
Manuela Guerreiro

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