Blog de apoio ao CUM GRANO SALIS

segunda-feira, 30 de julho de 2007

Desporto e corrupção

Submetido a votação final global, foi aprovado pela Assembleia da República, em 12-7-2007, por unanimidade, o texto final apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 108/XCria um novo regime de responsabilidade penal por comportamentos susceptíveis de afectar a verdade, a lealdade e a correcção da competição e do seu resultado na actividade desportiva e ao projecto de lei n.º 320/XCombate à corrupção e defesa da verdade desportiva (PSD).

Ainda não publicada em Diário da República, o texto final da nova lei que cria um novo regime de responsabilidade penal por comportamentos susceptíveis de afectar a verdade, a lealdade e a correcção da competição e do seu resultado na actividade desportiva, passa a ser do seguinte teor:


Capítulo I
Disposições gerais

Artigo 1.º
Objecto

A presente lei estabelece o regime de responsabilidade penal por comportamentos antidesportivos, contrários aos valores da verdade, da lealdade e da correcção e susceptíveis de alterarem fraudulentamente os resultados da competição.

Artigo 2.º
Definições

Para os efeitos da presente lei, considera-se:

a) Dirigente desportivo: o titular do órgão ou o representante da pessoa colectiva desportiva, quem nela tiver autoridade para exercer o controlo da actividade e o director desportivo ou equiparado;

b) Técnico desportivo: o treinador, o orientador técnico, o preparador físico, o médico, o massagista, os respectivos adjuntos e quem, a qualquer título, orienta praticantes desportivos no desempenho da sua actividade;

c) Árbitro desportivo: quem, a qualquer título, principal ou auxiliar, aprecia, julga, decide, observa ou avalia a aplicação das regras técnicas e disciplinares próprias da modalidade desportiva;

d) Empresário desportivo: quem exerce a actividade de representação, intermediação ou assistência, ocasionais ou permanentes, na negociação ou celebração de contratos desportivos;

e) Pessoas colectivas desportivas: os clubes desportivos, as sociedades desportivas, as federações desportivas, as ligas profissionais, associações e agrupamentos de clubes nelas filiados, bem como as pessoas colectivas, sociedades civis ou associações de facto que se dedicam à actividade de empresário desportivo;

f) Agente desportivo: as pessoas singulares ou colectivas referidas nas alíneas anteriores, bem como as que, mesmo provisória ou temporariamente, mediante remuneração ou a título gratuito, voluntária ou obrigatoriamente, a título individual ou integradas num conjunto, participem em competição desportiva ou sejam chamadas a desempenhar ou a participar no desempenho de competição desportiva;

g) Competição desportiva: a actividade desportiva regulamentada, organizada e exercida sob a égide das federações desportivas ou das ligas profissionais, associações e agrupamentos de clubes nelas filiados ou das instâncias internacionais de que aquelas pessoas colectivas façam parte.

Artigo 3.º
Responsabilidade penal das pessoas colectivas e
equiparadas

1 — As pessoas colectivas e entidades equiparadas, incluindo as pessoas colectivas desportivas, são responsáveis, nos termos gerais, pelos crimes previstos na presente lei.

2 — O estatuto de utilidade pública ou de utilidade pública desportiva não exclui a responsabilidade penal das pessoas colectivas desportivas.

Artigo 4.º
Penas acessórias

Aos agentes dos crimes previstos na presente lei podem ser aplicadas as seguintes penas acessórias:

a) Suspensão de participação em competição desportiva por um período de seis meses a três anos;

b) Privação do direito a subsídios, subvenções ou incentivos outorgados pelo Estado, regiões autónomas, autarquias locais e demais pessoas colectivas públicas por um período de um a cinco anos;

c) Proibição do exercício de profissão, função ou actividade, pública ou privada, por um período de um a cinco anos, tratando-se de dirigente desportivo, técnico desportivo, árbitro desportivo, empresário desportivo ou pessoa colectiva ou entidade equiparada.

Artigo 5.º
Concurso

O exercício da acção penal ou a aplicação de penas ou medidas de segurança pelos crimes previstos na presente lei não impedem, suspendem ou prejudicam o exercício do poder disciplinar ou a aplicação de sanções disciplinares nos termos dos regulamentos desportivos.

Artigo 6.º
Denúncia obrigatória

Os titulares dos órgãos e os funcionários das federações desportivas ou das ligas profissionais, associações e agrupamentos de clubes nelas filiados devem transmitir ao Ministério Público notícia dos crimes previstos na presente lei de que tenham conhecimento no exercício das suas funções e por causa delas.

Artigo 7.º
Direito subsidiário

Aos crimes previstos na presente lei são subsidiariamente aplicáveis as disposições do Código Penal.


Capítulo II
Crimes

Artigo 8.º
Corrupção passiva

O agente desportivo que, por si ou, mediante o seu consentimento ou ratificação, por interposta pessoa, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para um qualquer acto ou omissão destinados a alterar ou falsear o resultado de uma competição desportiva é punido com pena de prisão de um a cinco anos.

Artigo 9.º
Corrupção activa

1 — Quem, por si ou, mediante o seu consentimento ou ratificação, por interposta pessoa, der ou prometer a agente desportivo, ou a terceiro com conhecimento daquele, vantagem patrimonial ou não patrimonial, que lhe não seja devida, com o fim indicado no artigo anterior, é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa.

2 — A tentativa é punível.

Artigo 10.º
Tráfico de influência

1 — Quem, por si ou, mediante o seu consentimento ou ratificação, por interposta pessoa, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para abusar da sua influência, real ou suposta, junto de qualquer agente desportivo, com o fim de obter uma qualquer decisão destinada a alterar ou falsear o resultado de uma competição desportiva é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.

2 — Quem, por si ou, mediante o seu consentimento ou ratificação, por interposta pessoa, der ou prometer a outra pessoa vantagem patrimonial ou não patrimonial para o fim referido no número anterior é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.

Artigo 11.º
Associação criminosa

1 — Quem promover, fundar, participar ou apoiar grupo, organização ou associação cuja finalidade ou actividade seja dirigida à prática de um ou mais crimes previstos na presente lei é punido com pena de prisão de um a cinco anos.

2 — Quem chefiar ou dirigir os grupos, organizações ou associações referidos no número anterior é punido com a pena nele prevista agravada de um terço nos seus limites mínimo e máximo.

3 — Para os efeitos do presente artigo considera-se que existe grupo, organização ou associação quando esteja em causa um conjunto de, pelo menos, três pessoas, actuando concertadamente durante um certo período de tempo.

Artigo 12.º
Agravação

1 — As penas previstas no artigo 8.º e no n.º 1 do artigo 10.º são agravadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo, se o agente for dirigente desportivo, árbitro desportivo, empresário desportivo ou pessoa colectiva desportiva.

2 — Se os crimes previstos no artigo 9.º e no n.º 2 do artigo 10.º forem praticados relativamente a pessoa referida no número anterior, o agente é punido com a pena que ao caso caberia, agravada de um terço nos seus limites mínimo e máximo.

Artigo 13.º
Atenuação especial e dispensa de pena

1 — Nos crimes previstos na presente lei:

a) A pena é especialmente atenuada se o agente auxiliar concretamente na recolha das provas decisivas para a identificação ou a captura de outros responsáveis;

b) O agente é dispensado de pena se repudiar voluntariamente, antes da prática do facto, o oferecimento ou a promessa que aceitara ou restituir a vantagem ou, tratando-se de coisa fungível, o seu valor.

2 — No crime previsto no artigo 11.º, a pena pode ser especialmente atenuada ou não ter lugar a punição se o agente impedir ou se esforçar seriamente por impedir a continuação dos grupos, organizações ou associações, ou comunicar à autoridade a sua existência de modo a esta poder evitar a prática de crimes.

Capítulo III
Disposições finais

Artigo 14.º
Prevenção

As federações, as sociedades e os clubes desportivos promovem anualmente acções formativas, pedagógicas e educativas, com a finalidade de sensibilizar todos os agentes desportivos para os valores da verdade, da lealdade e da correcção e prevenir a prática de factos susceptíveis de alterarem fraudulentamente os resultados da competição.

Artigo 15.º
Norma revogatória

São revogados todos os artigos do Decreto-Lei n.º 390/91, de 10 de Outubro, com excepção do artigo 5.º.

Artigo 16.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor em 15 de Setembro de 2007.